A vida da família de Ricardo, então com 6 anos, mudou em 2011. O menino tinha acabado de sair do coma depois de uma anemia grave. Precisava de estrutura em casa para fazer fisioterapia e completar sua recuperação. O Instituto Dara fez uma obra de saneamento e ampliação que transformou a vida dessa família. Segundo a mãe, Cristiane, a mudança inspirou a comunidade. “A vizinhança ficou surpresa: ‘O que está acontecendo na vida dela? A casa dela ficou bonita de uma hora pra outra…’”, lembra ela, em entrevista anos mais tarde. “Foi quando todo mundo começou a pintar suas casas, entrar em obra… Aí começou a valorização da nossa rua, do nosso bairro.”
A consultoria do Instituto Dara
A equipe de Moradia do Instituto Dara também acompanha todas as famílias atendidas. Para grande parte, passar pela consultoria é suficiente. Ali, os especialistas orientam sobre tudo o que diz respeito à casa, desde orientações sobre como seguir com uma reforma, o que precisa ser mudado na moradia para torná-la saudável, quais são os direitos e deveres de um locatário até dicas de medidas simples, como limpeza e manutenção.
O público-alvo do Instituto Dara são famílias com renda muito baixa e que moram em comunidades periféricas. Por terem renda baixa, geralmente oriunda de programas de transferência de renda do governo, as residências, por vezes, estão inacabadas ou construídas com improvisos.
O problema mais comum são as infiltrações, causa de muitas doenças respiratórias e alergias em geral. E as crianças, razão do elo entre as famílias e o Instituto Dara, são as mais vulneráveis. Entre os motivos estão paredes não impermeabilizadas, encanamentos que não recebem a manutenção devida e paredes muito próximas ou coladas em barrancos desprotegidos.
O conceito de arquitetura social
A área de Moradia atua dentro do conceito da arquitetura social, ou seja, realizar o mínimo necessário para a residência ter salubridade. Partindo desse princípio e utilizando a impermeabilização como exemplo, quando temos uma casa estanque — em que não entra água ou umidade — estamos aplicando a arquitetura social, mesmo que para isso ela não seja pintada.
Tornar a casa estanque é importante, mas trabalhar a autoestima da família, tornando-a “bela”, também. Uma atuação não desqualifica a outra, mas sim se complementam. Para isso é feito o trabalho individual entendendo a necessidade das famílias e até onde vamos trabalhar. É nesse ponto que entra outro detalhe importante: a participação ativa da família para que, quando a jornada no Dara terminar, ela esteja segura e informada para seguir neutralizando os aspectos insalubres da residência e fazendo melhorias.
Os números das moradias precárias
Segundo um estudo realizado em parceria pelo Instituto Locomotiva, pelo Data Favela e pela Central Única das Favelas (Cufa), 17,1 milhões de pessoas vivem nas favelas brasileiras, localizadas em sua grande maioria nas Regiões Metropolitanas (89%). São áreas com moradias precárias, construções em áreas de risco e problemas de saneamento há muito superados nas grandes cidades, como abastecimento de água, esgotamento sanitário e coleta regular de lixo.
Pequenas atitudes que fazem a diferença
Usando as infiltrações como exemplo, a equipe do Dara ensina a limpar as paredes expostas à umidade periodicamente com uma solução de água sanitária, para combater a proliferação de mofo. Também estimula a própria família — a mãe, na maioria dos casos — a realizar pequenos consertos que podem ser feitos sem a ajuda de profissionais, como a manutenção dos canos e dos registros da casa e outros pequenos reparos.
Mesmo quando é necessário chamar um profissional, nossa equipe ensina como incluir pequenos gastos no orçamento familiar e por que é tão importante fazê-lo. Um filtro de água, por exemplo. É comum as pessoas beberem água diretamente da rede de distribuição sem saber quanto isso pode fazer mal à saúde, pondo em risco a segurança alimentar e aumentando a contaminação por vermes.
Perigo da contaminação cruzada
Outro equívoco comum é usar um balde para dar descarga porque a válvula quebrou. Pode parecer inofensivo, mas o uso do balde aumenta a contaminação cruzada: os respingos do vaso sanitário se espalham por todo o banheiro e pelo corpo da pessoa, que vai deitar na cama, pegar os filhos no colo. Apenas lavar as mãos não é suficiente.
“Não tenho dinheiro pra isso” é a resposta natural. Mas quanto custa? Trocar a vela do filtro de barro ou contratar um “faz-tudo” da comunidade para o reparo na válvula da descarga são despesas menores do que a família imagina. São pequenas intervenções que cabem no orçamento com um mínimo de planejamento e ajuda a resolver problemas sérios por muito tempo. São casos em que a informação é o benefício mais precioso.
Intervenções estruturais
Alguns problemas estruturais da residência, no entanto, são mais complexos, caros e exigem intervenção, outro tipo de atendimento realizado pela equipe de Moradia. Como o orçamento do Instituto Dara é limitado, existem alguns pré-requisitos para a família se candidatar a esse benefício, uma forma de organizar a fila de prioridades. O principal é o engajamento dessa família no Plano de Ação Familiar (PAF). Se cumpridos os requisitos, a família recebe a mudança e tem como responsabilidade assumir a escolha dos profissionais e o acompanhamento da obra.
Dar autonomia às famílias é parte do nosso atendimento, porque impacta diretamente na autoestima. Muitos passam a perceber, durante a realização da obra, que são capazes de conduzir uma intervenção que não será apenas da casa, mas da vida da família e também da comunidade. A opção pela família ser responsável por apurar e escolher os profissionais e fornecedores é também uma ajuda para estimular a economia local e fortalecer os laços comunitários, como aconteceu com a família de Cristiane.